Xeroderma pigmentoso: entenda por que povoado em Goiás concentra um dos maiores grupos de portadores da doença rara no país

  • 15/11/2025
Xeroderma pigmentoso Uma década após a primeira reportagem do g1 revelar a alta concentração de casos de xeroderma pigmentoso (XP) em Araras, um dos maiores agrupamentos conhecidos da doença em um único povoado — a rotina na comunidade segue marcada por cuidados extremos com a luz, tratamento contínuo e mobilização coleti Araras é um povoado rural que pertence ao município de Faina, no noroeste de Goiás. Ele fica a 40km da sede do município e tem cerca de 600 moradores. Foi ali, em uma comunidade marcada por laços familiares antigos e repetidos casamentos entre parentes, que os primeiros casos de xeroderma pigmentoso começaram a aparecer gerações atrás. Hoje, 16 pessoas convivem com o quadro clínico da doença e mais de 100 carregam a mutação genética, ainda sem sintomas. O diagnóstico, tardio para muitos anos, revelou uma realidade que passou invisível por gerações: famílias inteiras com o mesmo gene alterado, fruto de um passado de casamentos consanguíneos e isolamento geográfico. “Aqui a convivência é natural, mas o preconceito ainda existe” ✅ Clique aqui e siga o perfil do g1 Goiás no WhatsApp A ex-presidente da Associação Brasileira do Xeroderma Pigmentoso, ABRAXP, Gleice Francisca Machado, acompanhou de perto essa transformação. Mãe de um jovem de 22 anos diagnosticado com XP, ela presidiu a entidade por 12 anos — tempo suficiente para ver o medo dar lugar ao acolhimento, e a desinformação, ao cuidado. Luiz Carlos, também portador de xeroderma pigmentoso, vive a realidade de quem precisa evitar a luz e lidar com as limitações impostas pela doença Fábio Lima/O Popular “Hoje eles têm um conhecimento maior sobre como lidar. Aqui, entre nós, é natural. Ninguém mais acha que é contagioso. Mas fora daqui, ainda há preconceito. O rosto é o lugar mais afetado, e as marcas acabam falando primeiro.” LEIA TAMBÉM: Professora com síndrome da pessoa rígida luta para conseguir remédio de alto custo Família luta na Justiça por medicamento de R$ 18 milhões para menino de 9 anos com doença rara Paciente com doença rara comove a web ao conseguir ir ao cinema pela 1ª vez após 7 anos; vídeo Gleice explica que os pacientes tentam levar uma vida normal, mas a rotina é limitada. Muitos não estudam, não trabalham fora e passam o dia dentro de casa. “A doença judia. Quem tem ferida, quem sente dor, sabe o que é esperar. E mesmo quando há tratamento, o processo é dolorido, caro, lento.” Seu filho, que abandonou os estudos e enfrenta depressão, simboliza um desafio silencioso: o impacto emocional de uma condição que exige não apenas resistência física, mas também social e psicológica. Agricultor Deide Freire. Seu rosto foi deformado por retirada de tumores Fábio Lima/O Popular “É uma luta por dignidade, não só por tratamento” A Associação Brasileira de Xeroderma Pigmentoso surgiu em 2009, quando o diagnóstico coletivo começou a ser compreendido. Desde então, as conquistas vieram em passos lentos, muitas vezes garantidas na Justiça. “A principal luta hoje é pela imunoterapia gratuita e pela cirurgia de Mohs no SUS”, diz Gleice. “São procedimentos que evitam novas mutilações e recidivas, mas o acesso ainda é judicializado. É um sofrimento que poderia ser evitado.” Ela também cita promessas não cumpridas — como uma escola e uma unidade básica de saúde que deveriam ter sido inauguradas em 2014 — e ressalta que a sobrevivência das famílias depende da continuidade das políticas públicas. “Não basta ter uma estrutura adaptada. Falta tratamento, acompanhamento, acolhimento. É uma comunidade que vive de superação, mas que ainda espera ser plenamente reconhecida.” Cláudia Sebastiana mostra pele escura por causa do xeroderma pigmentoso Fernanda Borges/G1 A nova liderança e a rotina que o sol dita Desde 2023, a presidência da associação está nas mãos de Maria Darcy, também portadora. Ela assumiu o cargo motivada pela vontade de preservar a causa dentro da própria comunidade. “Se eu não assumisse, cairia nas mãos de quem não conhece a nossa luta. A gente vive isso todos os dias.” Maria Darcy mora em outro distrito de Faina, mas mantém contato constante com as famílias de Araras. Conta que a associação conquistou a cobertura da quadra da escola, a construção de 50 casas populares, um veículo para transporte dos pacientes e a renovação de convênios que garantem protetor solar para 120 famílias. Ainda assim, a estrutura segue precária. Alisson convive com o xeroderma pigmentoso desde a infância Fábio Lima/ O Popular A explicação da ciência e os 15 anos de acompanhamento da Dra. Sulamita Desde 2010, a dermatologista Sulamita Costa Wirth Chaibub acompanha o grupo. Coordenadora do atendimento no Hospital Geral de Goiás por sete anos, ela continua ligada à associação como consultora científica. Para ela, o maior avanço não foi tecnológico, mas humano: o entendimento da doença e a aceitação social. “Quando cheguei, mais de 30 pessoas já haviam morrido sem diagnóstico. Eles não sabiam o que tinham. Achavam que fosse uma herança de antepassados ou até algo contagioso. Hoje sabem o nome, a causa e o que precisam evitar. Isso muda tudo.” A médica explica que o XP é causado por falta de uma enzima que repara os danos do DNA provocados pela luz solar. “Todos nós sofremos pequenas queimaduras de sol, mas o organismo repara. No xeroderma, essa correção falha. O dano se acumula e vira câncer.” Em Araras, o tipo predominante é o XP variante, que permite alguma reparação, mas não o suficiente para reproduzir células normais. Por isso, os cânceres aparecem cedo, e em alguns casos, de forma agressiva. “Eles eram lavradores, trabalhavam sob o sol de Goiás, uma das regiões mais quentes do país. Agora vivem praticamente de portas fechadas. O ganho foi entender que o cuidado é também uma forma de liberdade.” Entre conquistas e esperanças Ao longo de 15 anos, a equipe de Sulamita, em parceria com a associação e entidades como a Sociedade Brasileira de Dermatologia, organizou mutirões periódicos em Araras. Médicos cirurgiões atendem e operam os pacientes no próprio povoado, o que evitan longos deslocamentos e reduz filas de espera. Os moradores também recebem protetor solar gratuito, roupas com proteção UV e acompanhamento especializado. “Hoje, cinco deles já usam imunobiológicos, medicamentos de ponta que evitam a progressão do câncer. Não é cura, mas é um avanço. E o futuro está na terapia gênica, que um dia poderá corrigir o DNA defeituoso.” A médica reforça que o acolhimento é parte do tratamento: “Eles devem ser vistos como cidadãos comuns que vivem com uma doença grave — e não como uma exceção. O preconceito ainda existe, mas já não define quem eles são.” Gleice dedicou 12 anos à presidência da associação que representa os portadores de xeroderma pigmentoso em Araras. Mãe de um jovem com a doença, ela transformou a própria vivência em luta por acesso, dignidade e tratamento para toda a comunidade Fábio Lima/O Popular Sombras, cuidado e esperança Para as crianças, o isolamento é uma das faces mais duras da doença. Elas estudam em horários adaptados e brincam apenas quando o sol se põe. “Há muito tempo pedimos uma quadra coberta, para que elas possam correr e brincar. São crianças normais, só não podem estar sob o sol”, lamenta a médica. A rotina em Araras é marcada por cuidados, mas também por afeto e solidariedade. Famílias que antes viviam escondidas hoje dividem histórias, trocam experiências e se reconhecem como parte de algo maior. “A comunidade se supera todos os dias. Aprendeu a resistir sem perder a esperança”, resume Gleice. Hoje, mesmo com avanços no tratamento e no entendimento da doença, Araras ainda depende da solidariedade entre os próprios moradores e do olhar atento de quem vem de fora. Lá, onde a luz ainda representa risco, o que mantém a vida possível é o cuidado mútuo, e a esperança de que a ciência e as políticas públicas caminhem tão rápido quanto o tempo que o sol demora a nascer. 📱 Veja outras notícias da região no g1 Goiás. VÍDEOS: últimas notícias de Goiás

FONTE: https://g1.globo.com/go/goias/noticia/2025/11/15/xeroderma-pigmentoso-entenda-por-que-povoado-em-goias-concentra-um-dos-maiores-grupos-de-portadores-da-doenca-rara-no-pais.ghtml


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